Em imunohistoquímica, o anticorpo que actua reciprocamente com o antigénio na célula designa-se de anticorpo primário.
Uma molécula proteica de imunoglobulina (Ig) típica, tem um coeficiente de sedimentação de cerca e 7S e um peso molecular de aproximadamente 150000 daltons.
Um anticorpo é um heterotetrâmero glicoproteico que contém duas cadeias pesadas idênticas (cadeias H com aproximadamente 50000 daltons e 440 aminoácidos cada) e duas cadeias leves idênticas (cadeias L com aproximadamente 25000 daltons e 212 aminoácidos cada).
A forma global de uma molécula de Ig representa-se pela letra Y (Figura I1).

Figura I1 –
Diagrama que mostra a estrutura de uma molécula de imunoglobulina.
É composta por duas cadeias pesadas idênticas (B – azul) e duas cadeias leves (A – rosa).
A extremidade da cauda do Y consiste nas metades carboxílicas de duas cadeias pesadas idênticas, mantidas juntas por ligações covalentes dissulfídricas bem como numerosas interacções não-covalentes entre as cadeias laterais de aminoácidos que contribuem para a
estrutura e estabilidade da molécula. 1 – região variável. 2 – região constante. C – pontes dissulfeto. Fonte: Wikipedia
Existem cinco classes principais de imunoglobulinas (Tabela I1):
- imunoglobulina M (IgM)
- imunoglobulina G (IgG)
- imunoglobulina A (IgA)
- imunoglobulina E (IgE)
- imunoglobulina D (IgD)
As cadeias pesadas das imunoglobulinas (ou isotipos) em cada classe designam-se por gama (γ), miu (μ), alfa (α), epsilon (δ) e delta, para as classes de IgG, IgM, IgA, IgE e IgD respectivamente.
A IgG é a imunoglobulina mais abundante no organismo. Existem quatro subclasses de IgG humano, distinguidas por diferenças na sequência da cadeia gama, e numeradas de acordo com as suas concentrações decrescentes séricas médias: IgG1, IgG2, IgG3, e IgG4. As suas propriedades funcionais distintas, são conferidas pela parte carboxi-terminal da cadeia pesada, que não está associada com a cadeia leve.
O anticorpo IgG (Figura I2) é composto por quatro cadeias polipeptídicas, compreendendo duas cadeias leves idênticas e duas cadeias pesadas idênticas, formando uma estrutura em forma de Y.

Figura I2 – Stansfield, William D., Colomé, Jaime S., Cano RJ. Biologia Molecular e Celular. McGraw-Hill de Portugal, Lda.; 1998. Legenda: VH – Variable Heavy (região variável, cadeia pesada). CH – Constant Heavy (região constante, cadeia pesada). VL – Variable Light (região variável, cadeia leve). CL – Constant Light (região variável, cadeia leve). Fc – Fragmento Fc. Fab (sombreado a cinzento) – Fragmento Fab.
Cada uma das quatro cadeias possui uma região variável (V) no seu terminal amino, o que contribui para o local de ligação ao antigénio, e uma região constante (C) que determina o isotipo. O isotipo da cadeia pesada determina as propriedades funcionais do anticorpo.
As cadeias leves estão ligadas às cadeias pesadas por muitas interações não covalentes e por pontes dissulfeto.
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IgA – Encontra-se em áreas de mucosa, como os intestinos, sistema respiratório e urinário ( ex, muco, suor, lágrima, saliva, suco gástrico) prevenindo a sua colonização por patogénios. Passa de mãe para filho via aleitamento.
IgD – Funciona principalmente como um receptor de antigénios nas células B imaturas.
IgE – Liga-se a alergénios e activam os mastócitos (que são responsáveis pela libertação de histamina) e os basófilos. Também é efectora na protecção de helmintas.
IgG – Participa da opsonização (processo que facilita a acção do sistema imune para fixar opsoninas, ou fragmentos do complemento, na superfície bacteriana permitindo a fagocitose), activação do sistema de complemento (inflamação e fagocitose), citotoxicidade mediada por células dependentes de anticorpo, É o único tipo de Ig que ultrapassa a barreira placentária.
IgM – Expressa na superfície das células B imaturas. Elimina patógenios nos estadios iniciais da imunidade mediada pelas células B antes de existir IgG suficiente no organismo.
Das cinco classes de imunoglobulinas, a IgG e a IgM, são os anticorpos mais frequentemente utilizados em imunohistoquímica. O isotipo IgG é o preferido porque a sua produção e ligação é mais consistente. Os anticorpos IgM podem ser usados se não houver outro isotipo disponível.
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As regiões variáveis (V) do par de cadeias pesadas e leves em cada braço do Y, estão ligadas para gerar dois sítios idênticos de ligação ao antígenio. O facto de existirem dois locais de ligação ao antígenio, permite que cada anticorpo se ligue a dois antígenios, tornando a ligação muito mais estável.
O tronco do Y, região constante ou fragmento Fc, é composto pelos domínios carboxi-terminais das cadeias pesadas. Na junção dos braços para a cauda do Y encontra-se a região de charneira. As regiões de charneira e de fragmentos Fc são diferentes nos vários isotipos, determinando assim as suas propriedades funcionais. Contudo, a organização global dos domínios é semelhante em todos os isotipos.
Nos anticorpos, existem dois tipos de cadeias leves, denominados lambda (λ) e kappa (κ). Uma dada imunoglobulina ou tem cadeias κ ou cadeias λ, nunca uma de cada. Não foi encontrada nenhuma diferença funcional entre anticorpos com cadeias leves λ ou κ, e qualquer um dos tipos de cadeia leve podem ser encontradas em anticorpos de qualquer uma das cinco classes principais.
Os primeiros 65 aminoácidos nas extremidades amínicas das cadeias pesadas, variam na sua sequência de uma molécula de imunoglobulina (Ig) para outra, se produzidas por diferentes clones de células B. No entanto, as Ig produzidas por elementos de um clone de plasmócitos, são idênticas em todos os aspectos e são designados de anticorpos monoclonais.
O terminal amino variável de uma cadeia pesada é referida como região variável (VH).
Do mesmo modo, as cadeias leves têm um único domínio variável (VL) nas suas extremidades amínicas e apenas um domínio constante (CL) suas extremidades carboxílicas.
No anticorpo, o local de ligação ao antigénio (ou paratopo) está restringido a três regiões hipervariáveis dentro dos domínios variáveis (VH e VL) de uma imunoglobulina e são designadas HV1, HV2, e HV3.
As regiões hipervariáveis, ou regiões determinantes de complementaridade (CDRs – CDR1, CDR2, e CDR3), são de estrutura complementar à dos epítopos no antigénio.
São as CDRs de ambos os domínios VH e VL (combinação da cadeia pesada e da cadeia leve), e não cada uma das cadeias isoladamente, que contribuem para o local de ligação do anticorpo ao antigénio.
Existem três domínios constantes (C1, C2 e C3) na região constante das cadeias pesadas, nas classes IgG, IgA e IgD, e quatro domínios constantes nas classes IgM e IgE. Dentro de uma classe de Ig, todos os domínios constantes têm sequências homólogas de aminoácidos. Entre os domínios CH1 e CH2 existe uma região de charneira flexível, que permite aos braços do Y formarem uma variedade de ângulos para se ligar a determinantes antigénicos idênticos a distâncias variáveis.
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A proporção dos dois tipos de cadeia leve varia de espécie para espécie. Em camundongos, a relação média de κ para λ é 20:1, enquanto que em seres humanos é 2:1 e no gado é 1:20. A razão para esta variação é desconhecida.
Variações nesta relação podem ser utilizadas para detectar a proliferação anormal de um clone de células B. Estes estariam todos a expressar a cadeia leve idêntica e, portanto, um excesso de cadeias leves λ numa pessoa, pode indicar a presença de um tumor de células B produzindo λ.
As imunoglobulinas de uma espécie são antigénios estranhos quando injectados noutra espécie, levando o receptor a produzir os anticorpos próprios para os anticorpos estranhos.
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As enzimas proteolíticas (proteases) que clivam sequências de polipéptidos têm sido utilizadas para dissecar a estrutura do anticorpo e para determinar quais as partes da molécula que são responsáveis pelas suas várias funções.
A papaína cliva as moléculas de IgG, do lado amino terminal das ligações dissulfeto, em três fragmentos. Entre o domínio CH1 e CH2, forma duas moléculas Fab (fragmentos de ligação a antigénios) e um fragmento Fc (fragmento cristalizável). O fragmento Fc consiste nas metades carboxílicas de duas cadeias H idênticas, contendo todos os domínios CH, com excepção do CH1.
Outra protease, a pepsina, cliva na mesma região geral da molécula de anticorpo como a papaína, mas no lado carboxi-terminal das ligações dissulfeto. Isto produz um fragmento, o fragmento F (ab)2, no qual os dois braços de ligação ao antigénio da molécula de anticorpo permanecem ligados. Neste caso, a parte restante da cadeia pesada é cortada em vários pequenos fragmentos. O fragmento F (ab)2 não tem exactamente as mesmas características de ligação ao antigénio do anticorpo original, mas não é capaz de interagir com qualquer molécula efectora. É, portanto, de valor potencial em aplicações terapêuticas de anticorpos, bem como na investigação sobre o papel funcional da porção Fc (Figura I3).

Figura I3 – Kindt TJ, Goldsby RA, Osborne BA, Kuby J. Kuby Immunology. W. H. Freeman; 2007.
A IgM é a classe de anticorpos produzida inicialmente por todas as células B virgens na resposta imunitária primária (humoral), porque pode ser expressa sem mudar de isotipo. Mais tarde, esse mesmo plasmócito poderá segregar um anticorpo de uma classe diferente (por exemplo, IgG). No entanto, todos estes anticorpos possuem o mesmo tipo de cadeia leve e as mesmas regiões variáveis em ambas as cadeias pesadas e leves. Assim, o local de ligação de antigénios (paratopo) no anticorpo nunca muda durante a vida de um plasmócito.
A mudança de classe de um anticorpo, envolve apenas a região constante das cadeias pesadas (H). A IgM consiste em cinco subunidades (pentâmero) com aproximadamente 180KDa cada, unidas covalentemente perto das suas extremidades carboxílicas por ligações dissulfídricas, juntamente com uma única cadeia polipeptídica, denominada cadeia J. Assim, cada molécula de IgM tem 10 paratopos potenciais.