INFLAMAÇÃO
A cistite, ou inflamação da bexiga, é uma situação comum em todas as idades, mas com variação da causa nos diferentes grupos etários.
Por norma, as alterações inflamatórias, são uma consequência secundária de outra patologia. Os processos inflamatórios podem ser considerados primários, quando causados por infecções, tumores, processos obstrutivos ou compressões, e secundários, quando consequência de doenças como tuberculose renal, diabetes e imunossupressão.
Citologicamente, observa-se aumento do número de células inflamatórias, polimorfonucleares, histiócitos e por vezes linfócitos, eosinófilos e plasmócitos. Também são observadas células epiteliais com alterações inflamatórias, halos perinucleares, núcleos ligeiramente aumentados e irregulares, cromatina de distribuição homogénea, vacuolização citoplasmática e nuclear.
ALTERAÇÕES INFECCIOSAS
Bactérias
Podem ser observadas diferentes formas bacterianas como cocos ou bacilos, no entanto a sua correcta identificação só é possível através de exame bacteriológico. É frequente a infecção por Escherichia coli.
Fungos
A Candida albicans é o fungo que causa infecções com maior frequência, e pode ser observada na forma de esporos ou pseudohifas. Pode ter grande importância em doentes com transplantes renais ou imunossuprimidos. É frequente existir obstrução dos ureteres, pela formação de rolhões de fungos. Outros fungos, menos comuns e que causam cistites são o Aspergillus, Mucor, Blastomyces, Histoplasma, Cryptococcus e Coccidioides, detectados em amostras urinárias, particularmente em imunossuprimidos.
Parasitas
O Schistosoma haematobium é o agente infeccioso mais frequente. É endémico em algumas regiões de África, sendo transmitido por um hospedeiro (caracol de água doce). A forma móvel do parasita penetra pela pele nua e intacta, ou pelas mucosas como da boca e esófago, após ingestão da água, ou anal ou genital. Ela continua a penetrar os tecidos até encontrar pequenos vasos sanguíneos, no interior dos quais entra e migra até à bexiga, onde maturam e depositam os ovos. Os ovos têm aspecto translúcido, com um espículo terminal. Este parasita pode romper as paredes da bexiga causando hematúria.
No Schistosoma mansoni, os ovos também são translúcidos mas com um espículo lateral. Este parasita é encontrado no intestino e no fígado, mas também pode ser encontrado na urina.
O Schistosoma haematobium está associado ao carcinoma da bexiga, devido à fibrose e reacções inflamatórias persistentes causando metaplasia reactiva. Como o parasita produz hormonas relacionadas com o estrogénio, os doentes infectados apresentam estas hormonas em circulação.
A infecção mais frequente na mulher é por Trichomonas vaginalis, que pode ser consequência da contaminação de uma infecção vaginal e no caso do homem por Trichomonas hominis. A tricomoníase no sistema urinário é rara.
Outros parasitas incluem o Enterobius vermicularis e o Toxoplasma.
Vírus
Citomegalovirus (CMV)
Numa fase inicial da infecção, podem ser observadas inclusões nucleares virais múltiplas, pequenas e basófilas, com halos perinucleares. Em fases mais avançadas, as células aumentam de tamanho e as inclusões são grandes apresentando o aspecto de “olho de coruja”.
Herpes simplex
As alterações virais podem ser observadas em células multinucleadas, isoladas ou em agregados. A moldagem nuclear é marcada, e a cromatina fica com um aspecto de vidro fosco. As inclusões intranucleares são frequentemente eosinófilas.
Poliomavirus
Os poliomavirus são virus de DNA da familia Pappoviridae, e compreendem o vírus BK (iniciais do paciente renal transplantado, cujo vírus foi encontrado na sua amostra de urina), JC (John Cunningham) altamente prevalentes no Homem, enquanto o SV-40 é um vírus dos símios mas que também pode provocar infecções em humanos.
As células infectadas (Decoy cell) variam no tamanho e ficam aumentadas. A inclusão viral é basófila, homogénea preenchendo na totalidade o núcleo, com padrões da cromatina irregulares. As células infectadas são geralmente atípicas podendo ser confundidas com células malignas. O poliomavirus pode coexistir com o cancro.
HPV
O vírus do papiloma Humano pode afectar o sistema urinário, mas quando os efeitos citopáticos provocados pelo HPV são vistos em urinas espontâneas de mulheres, as células geralmente são provenientes da vulva ou da vagina. Coilócitos numa amostra obtida por cateterização, indica condiloma no sistema urinário.
ALTERAÇÕES NÃO INFECCIOSAS
Cristalúria
Os cristais são achados comuns nas amostras de urina, sendo que a maioria não tem significado clínico. Os cristais são compostos por uma matriz de microproteínas, de cor clara transparente, formas irregulares e não são birrefrigentes.
Existem outros tipos de cristais identificáveis apenas quimicamente e outros são identificáveis pela sua forma característica e que são birrefrigentes. Entre os vários tipos de cristais incluem-se o triplo fosfato, ácido úrico, oxalato de cálcio, colesterol, etc.
Citologicamente é observado aumento da celularidade, aumento do número de células inflamatórias, cristais ou fragmentos destes com as configurações correspondentes que os permitem identificar.
Formação de cilindros renais
Os cilindros podem ser hialinos ou granulares. São causados pela acumulação de proteínas, eritrócitos e células necróticas, que ficam com um aspecto moldado em cilindros. Os cilindros hialinos são compostos por material proteico eosinófilo e homogéneo, podendo ter algumas células renais na periferia. Os cilindros granulares são constituídos por restos celulares com células tubulares degeneradas de citoplasma granular.
Os cilindros encontrados em amostras urinárias, podem ou não ter significado clinico, assim como podem ser uma manifestação de uma doença renal severa. Cilindros de eritrócitos são característicos de doença glomerular. Cilindros de leucócitos são característicos de doenças tubulointersticiais e podem estar associadas a rejeição de transplantes.
Cilindros epiteliais podem ser vistos em quase todas as doenças, e são compostos por células tubulares renais degeneradas. Cilindros gordurosos contêm vacúolos de lípidos e são encontrados em pacientes com síndrome nefrótico.
ALTERAÇÕES REACTIVAS INESPECÍFICAS NAS CÉLULAS UROTELIAIS
Inflamação e ferimentos no urotélio resultam em alterações reactivas nas células uroteliais.
Citologicamente é observado vacuolização do citoplasma, aumento nuclear e nucléolo proeminente.
Diagnóstico diferencial:
Em alguns adenocarcinomas pode existir vacuolização do citoplasma. No entanto, os núcleos são muito atípicos e raramente se confunde com células uroteliais reactivas.
EFEITOS DA RADIAÇÃO E DA QUIMIOTERAPIA
A radiação tipicamente provoca um aumento celular e nuclear, embora não exista um aumento da relação núcleo/citoplasma. As células afectadas aparecem isoladas. É comum existir vacuolização quer do citoplasma quer do núcleo. Os efeitos da radiação podem permanecer semanas, meses e até anos depois do tratamento ter terminado.
Tiotepa e mitomicina C, medicamentos usados no tratamento de cancro da bexiga, produzem alterações semelhantes às encontradas nos efeitos da radiação nas células. As células são frequentemente multinucleadas, com vacuolização do núcleo e citoplasma, membrana nuclear irregular e hipercromasia.
As alterações provocadas pela radiação e pela quimoterapia podem mimetizar o carcinoma urotelial.