A hematoxilina é isolada a partir de uma planta leguminosa, a Haematoxylon campechianum ou Pau Campeche. A primeira aplicação biológica bem sucedida da hematoxilina foi descrita por Bohmer em 1865 e desde então apareceram diversas formulações. No entanto, as hematoxilinas de Harris, Gill, Mayer e Weigert tornaram-se as mais populares para a coloração nuclear.
A palavra “hematoxilina” para descrever a solução corante é imprecisa, mas continua a ser utilizada por uma questão de conveniência.
Para a hematoxilina poder ser utilizada como corante nuclear, precisa de ser convertida em hemateína através de oxidação (adquirindo coloração azul-púrpura) e combinada com um ião metálico (mordente).
O processo de oxidação pode ocorrer espontaneamente em contacto com o oxigénio atmosférico durante 4 a 6 semanas, ou ser induzido artificialmente recorrendo a agentes químicos de carácter oxidante, nomeadamente o óxido de mercúrio, iodato de sódio, iodato de potássio, permanganato de potássio, clorato de potássio, entre outros. Nesta fase, a hemateína é fracamente ácida (aniónica). Após o processo de oxidação da hematoxilina, é necessário aumentar a sua capacidade tintorial. Para isso, são adicionados à hemateína substâncias metálicas – mordente – e que atuam como mediador na ligação entre o corante e o tecido. Estes compostos conferem à hematoxilina propriedades fortemente básicas (catiónica), o que lhe permite adquirir afinidade para o tecido e corar os ácidos nucleicos. Os mordentes mais utilizados neste processo, normalmente bivalentes ou trivalentes, incluem sais de alumínio ou ferro, mas podem ser utilizados outros como o tungsténio ou o bismuto. À junção do mordente com a hemateína dá-se o nome de complexo mordente-hematoxilina ou “laca”. A título de exemplo, quando o mordente é o alumínio, designa-se a hematoxilina de alúmen-hematoxilina.
Quando a hematoxilina é oxidada quimicamente, as soluções devem sempre conter hematoxilina não oxidada, uma vez que a que oxidação excessiva ou completa da hematoxilina (sobre-oxidação), pode transformar a hemateína num composto leucoderivado sem capacidade de corar intensamente os ácidos nucleicos de azul. Outra forma de evitar a sobre-oxidação é adicionar apenas metade da concentração do agente oxidante à solução de hematoxilina. Desta forma, quando todo o agente oxidante tiver sido utilizado, o restante processo de oxidação ocorre espontânea e mais lentamente com o oxigénio atmosférico, conferindo à hemateína capacidade corante por mais tempo.
A cor da hemateína varia de acordo com o mordente utilizado.
Quando se utilizam como mordentes sais de alumínio, a hemateína adquire a cor azul escura. Esta fórmula de hemateína tem cor roxa-avermelhada a pH menor que 3 e cor azul-violeta a pH acima de 3.
As soluções de hematoxilina, além do agente oxidante e do mordente, contêm outros aditivos tais como glicerina ou etilenoglicol. Um dos objetivos destes aditivos é aumentar a solubilidade da hemateína na solução, assim como reduzir a sobre-oxidação. Outro dos objetivos prende-se com o facto de o complexo hematoxilina-alúmen ser pouco solúvel em solução, o que provoca a sua precipitação e a formação de um sedimento metálico na superfície da hematoxilina. O etileno glicol, utilizado na hematoxilina de Gill, previne a formação deste precipitado aumentando a estabilidade da solução.
Os principais procedimentos para corar o núcleo celular caem maioritariamente em duas metodologias:
- procedimento efetuado com corantes básicos (catiónicos) que dependem da presença de ácidos nucleicos (DNA e RNA) para que sejam estabelecidas ligações salinas (ou iónicas).
- procedimento que utiliza um mordente metálico combinado com um corante. O mordente liga-se aos grupos tecidulares (e que não são necessariamente ácidos) e este complexo forma um quelato com o tecido sob a forma de precipitado insolúvel. Este procedimento resulta particularmente na demonstração nuclear de tecidos previamente descalcificados, nos quais os ácidos nucleicos foram removidos ou destruídos.
São várias as teorias propostas na tentativa de perceber o mecanismo de coloração da hematoxilina ao núcleo celular.
No entanto, a teoria mais aceite preconiza que a primeira fase da coloração nuclear envolve uma ligação eletrostática da hemateína (catiónica) com os grupos aniónicos dos grupos fosfato do DNA (carregados negativamente). Esta teoria é também consistente com a observação de que outros grupos aniónicos, tais como os encontrados nas mucinas e nos proteoglicanos, podem corar com a hematoxilina e provocar coloração “de fundo”.
A segunda fase da coloração, implica uma ligação covalente do mordente (carregado positivamente) aos radicais tecidulares aniónicos através da formação de um quelato, substituindo a ligação eletrostática previamente estabelecida. A maior estabilidade das ligações covalentes, contribui para a coloração relativamente permanente da hemateína ao núcleo.
Está também descrito que aconteça um efeito adicional de coloração entre a hemateína livre de mordente com os resíduos de arginina existentes nas histonas (proteínas básicas). Este fenómeno baseia-se no facto de não existir perda de coloração nuclear mesmo com a extração dos ácidos nucleicos dos tecidos.
A seletividade da coloração nuclear pode ser conseguida acidificando a solução de hemateína. A redução do pH (adição de H+) reduz o potencial ácido das moléculas anfotéricas (nomeadamente os aminoácidos), tornando-as neutras. O pH ácido também atrasa o processo de oxidação da solução corante.
As hematoxilinas podem ser classificadas como progressivas ou regressivas tendo como base a concentração de corante.
Convém salientar que apesar de estar convencionada a classificação em hematoxilinas progressivas e regressivas, qualquer das hematoxilinas mencionadas pode ser usada tanto de forma progressiva como de forma regressiva. É uma questão de adequar o tempo de coloração até ser alcançado o resultado cromático desejado.
Os corantes progressivos (por exemplo, a hematoxilina de Mayer) têm uma concentração mais baixa de corante e coram seletivamente as cromatinas nucleares. A intensidade pretendida é alcançada através do tempo de coloração, pelo que o núcleo é corado progressivamente sem ser necessário recorrer à diferenciação.
Os corantes regressivos (por exemplo, a hematoxilina de Harris) coram intensamente todas as estruturas nucleares e citoplasmáticas. Para se chegar a uma resposta cromática correcta, o excesso de corante é removido por tratamento com ácido diluído (diferenciação).
Após a etapa de diferenciação é necessário azular a hematoxilina para desta forma potenciar a cor azul nuclear. Por norma, o “azulamento” é alcançado através de água corrente. No entanto, a melhor forma de azular a hematoxilina é utilizando soluções aquosas básicas (com pH próximo de 8), como por exemplo amoníaco a 0,5%, tampão fosfato, carbonato de lítio ou bicarbonato de sódio.
Diferenciação
A maioria dos corantes, incluindo os que são usados como contrastantes, são utilizados progressivamente. No entanto, quando os corantes são usados de forma regressiva, o tecido é sobre-corado para depois ser diferenciado (ou descorado) até se alcançar a tonalidade cromática pretendida.
A maioria dos corantes usados regressivamente são associados a um mordente o que lhes confere propriedades básicas (ou catiónicas). Os corantes básicos são diferenciados por soluções fracamente ácidas, e os corantes ácidos são diferenciados por soluções fracamente alcalinas. A título de exemplo, as hematoxilinas de alúmen podem ser diferenciadas numa solução de ácido clorídrico e a eosina pode ser removida com uma solução de hidróxido de amónio.
Uma outra forma da diferenciação ser efetuada, é usando excesso de mordente para quebrar o complexo tecido-mordente. O excesso de mordente quebra a ligação tecido-mordente-corante, e o corante desagregado do tecido será “atraído” para o mordente que está em maior quantidade na solução diferenciadora, sendo deste modo removido do tecido. Um exemplo deste tipo de diferenciação acontece na coloração de Verhoeff.
Solução de ácido clorídrico a 1%
Ácido clorídrico …………………………. 1 mL
Álcool etílico a 70% ………………….. 99 mL
Colocar SEMPRE o ácido no álcool e não o álcool no ácido.
Solução de hidróxido de amónia a 1%
Hidróxido de amónia …………………… 1 mL
Água destilada …………………………… 99 mL
Soluções azulantes da hematoxilina
Após a etapa de diferenciação é necessário azular a hematoxilina para desta forma potenciar a cor azul nuclear. Por norma, o “azulamento” é alcançado através de água corrente. No entanto, a melhor forma de azular a hematoxilina é utilizando soluções aquosas básicas (pH próximo de 8), como por exemplo amoníaco a 0,5%, tampão fosfato, carbonato de lítio ou bicarbonato de sódio. A mudança de pH induzida por estes agentes “azulantes”, altera a solubilidade do corante. O complexo hemateína-alúmen é vermelho e solúvel a pH menor que 5. Estes agentes convertem o complexo vermelho e solúvel num complexo que é mais azul e insolúvel nas soluções corantes de rotina.
Seguem alguns exemplos.
Solução de amoníaco a 0,5%
Amoníaco ……………………… 2,5 mL
Água destilada ………………. 497,5 mL
Solução de carbonato de lítio a 0,5%
Carbonato de lítio ………….. 2,5 g
Água destilada ………………. 500 mL
Solução de Scott
Sulfato de magnésio (MgSO4) ……………… ……. 10 g
OU
Sulfato de magnésio (MgSO4*7H2O) …………… 20 g
Bicarbonato de sódio …………………………………. 2 g
Água destilada …………………………………………… 1000 mL
Tampão fosfato-salino (PBS) – 10X PBS (0.1M PBS, pH 7.4)
Fosfato dissódico* anidro (Na2HPO4) anidro ………….. 10,9 g
Fosfato monossódico** (NaH2PO4) anidro ……………… 3,2 g
Cloreto de sódio (NaCl) ………………………………………… 90 g
Água destilada …………………………………………………….. 1000 mL
Adicionar os reagentes à água, um a um.
Ajustar o pH a 7.4
Armazenar à temperatura ambiente em frasco bem fechado.
Diluir a 1:10 antes de ser utilizado e ajustar o pH, se necessário.
* Também designado de hidrogenofosfato dissódico
**Também designado de dihidrogenofosfato de sódio, fostato de sódio monobásico, fosfato de sódio diácido, bifosfato de sódio, fosfato ácido de sódio e fosfato de sódio primário.